Avaliação da efetividade da criação de marismas pelo plantio de gramíneas bioengenheiras do gênero Spartina no estuário da Lagoa dos Patos, RS, Brasil
Autor: Adriana Martins Guedes de Azevedo (Currículo Lattes)
Orientador: Dr Cesar Serra Bonifácio Costa
Resumo
Entre as plantas aquáticas vasculares de ambientes salinizados, as plantas de marismas (banhados costeiros salinizados na zona entremarés) são as mais cultivadas e plantadas pelo homem, particularmente com a finalidade do estabelecimento de barreiras naturais contra a erosão costeira e recuperação de áreas degradadas.Tolerantes a variações de salinidade, submersão periódica e condições hipóxicas do solo, elas são capazes de construir seu próprio ambiente formando estruturas biogênicas. A eficiência das marismas criadas em reproduzir os atributos estruturais e funcionais de marismas naturais ainda é questionada, particularmente se processos autogênicos são capazes de manter o desenvolvimento das marismas sob alta intensidade de forçantes alogênicos. Esta tese visou avaliar a estruturação temporal de marismas criadas através do plantio das gramíneas bioengenheiras nativas Spartina alterniflora e Spartina densiflora em um estuário micromareal, através da quantificação do processo autogênico e seu relacionamento com a disponibilidade de N e P, heterogeneidade ambiental estuarina e forçantes regionais. No Capítulo I, dois experimentos foram realizados em estufa agrícola para avaliar os efeitos da densidade de plantio e disponibilidade dos nutrientes N e P no desenvolvimento de mudas das gramíneas S. alterniflora e S. densiflora. Sob alta disponibilidade de nutrientes plantas de S. alterniflora tiveram sua produção foliar estimulada e produziram o dobro do número de hastes do que plantas não fertilizadas. Densidades iniciais de 400 ou mais hastes m-2 resultaram em alongamento vertical excessivo das hastes de S. alterniflora (cerca de 100 cm de altura). A adubação com razão 2N:1P resultou em melhor perfilhamento de ambas espécies. O Capítulo II descreve as similaridades e diferenças nas características estruturais de marismas criadas pelo plantio de gramíneas bioengenheiras e marismas naturais de referência, amostradas em 4 localidades no estuário da Lagoa do Patos (RS) durante o verão- outono 2012. Doze espécies de 8 famílias de angiospermas foram encontradas em 597 quadrados (0,5 X 0,5 m) observados. Todas marismas revelaram a presença de S. alterniflora nos pisos entremarés baixos e marismas maduras exibiram de 3 a 7 espécies. Análises de Agrupamento e de Correspondência, conforme a matriz de correlação das coberturas visuais, diferenciou as marismas maduras da maioria das marismas criadas e jovens. As marismas amostradas distribuíram-se entre -0,28 m e +0,91 m NML (nível médio da lagoa) e eram sujeitas a frequências de alagamento de 8,0 a 83,8% do tempo. As marismas maduras foram mais altas no entremarés do que as marismas criadas e jovens locais, bem como possuíam maiores teores de matéria orgânica (até 26,43%) e argilas (até 50%) no sedimento, além de menores teores de fosfato na água intersticial. Os resultados sugerem forte soerguimento orgânico e alto consumo de fósforo pela grande biomassa vegetal presente nas marismas maduras. A posição baixa no entremarés das marismas criadas dificulta o desenvolvimento de seus solos (baixos teores de finos e matéria orgânica) e resulta em redoxs positivos, devido ao batimento de ondas. Soerguimento orgânico (4-5% matéria orgânica), baixos redoxs (até -428 mV) e altos teores de N e P distinguem a parte mais continental de marismas jovens na enseada eutrofizada Saco da Mangueira de suas áreas baixas no entremarés e das marismas criadas. Maiores formações de biomassas aéreas nestes pisos altos das marismas jovens é possível pela maior disponibilidade de P em condições reduzidas. O Capítulo III faz uma avaliação dos papéis dos processos autogênicos e alogênicos no desenvolvimento de uma marisma criada pelo plantio de S. alterniflora ao longo de 3 anos (2012-2015). O desenvolvimento da marisma progrediu de forma autogênica, apesar de oscilações interanuais sequenciais de baixa vazão e de excessiva vazão associadas, respectivamente, a eventos de moderada intensidades de La Niña e de El Niño. Os blocos de plantio foram alagados 32,9-51,5% do tempo por águas com salinidade média de 23-26 em 2012, por 61,9-69,5% do tempo por água oligohalinas (< 5) em 2014. Em 2012, o sedimento arenoso do plano entremarés possuía menos de 7% finos, acumulando até 2015 altos teores médios de argilas (21,9 ± 10,9%) e matéria orgânica (14,7 ± 4,6%). A biomassa vegetal na marisma criada cresceu até valores máximos no segundo ano após o plantio (respectivamente, aérea= 1325-1364 g/m2 e subterrânea= 799-810 g/m2). As concentrações dos nutrientes intersticiais nos blocos de plantio refletiram o vigor da alteração autogênica, ocorrendo redução dos teores de fosfato na água intersticial possivelmente relacionados ao consumo pela vegetação, aeração da rizosfera pelas plantas e/ou soerguimento orgânico da marisma, com consequente aumento do potencial redox. O papel autogênico no desenvolvimento estrutural da marisma criada parece ser suportado pela alta disponibilidade de nutrientes nas águas superficiais e intersticiais do Saco da Mangueira.